segunda-feira, 22 de abril de 2013

Godofredo e a ausência

Godofredo Buarque de Almeida Didone era uma ilusão até para si mesmo. Considerava-se um pseudônimo e achava não ser mais que uma invenção. À noite, quando estava em casa, ponderava a verdade e não se acreditava verdadeiro, pensava que era essa a melhor maneira de passar o tempo.

Godofredo decidiu escrever sobre si, e não escolheu pseudônimos. Fez uma pequena autobiografia reflexiva e ponderou que a vida era uma questão de não se aperceber dela. Que a vida era acessória ao próprio ato de viver e que viver não era essencial.

Godofredo não enxergava prazer ou satisfação, mas não era caído à angústia ou ao desespero. Não se perguntava sobre Deus ou sobre a existência e não fazia maiores reflexões sobre a morte.

Godofredo Buarque de Almeida Didone não tinha amigos ou conhecidos e quando terminou a faculdade e abriu seu próprio negócio tratava-o com a indiferença com que se tratava. Mas era cordial com seus consumidores.

Godofredo não pensava em suicídio e não era depressivo, mas calado e distante. Sua família morava longe e ele não pensava em visitá-los. Guardava economias para a aposentadoria e pensava em se aposentar cedo. Não tinha namoradas e não pensava em filhos ou animais de estimação.

Godofredo não praticava esportes e assistia pouco a televisão. Não navegava na internet e nunca teve um videogame. Andava a pé e nunca havia ficado doente ou sofrido um acidente.

Godofredo Buarque de Almeida Didone trabalhava quando sentiu uma pontada no coração. Pensou que era a idade e decidiu ver um médico. O exame constatou nada de anormal, mas o médico recomendou repouso.

Godofredo acordou tarde naquele dia e pensou que havia nada pra fazer.